sábado, 12 de julho de 2014

“Estou indo embora do Brasil” ( Crônica do Prof. Cláudio Silva)

Ecos da derrota por 7 a 1 para a Alemanha na Copa do Mundo de 2014

                                                                                                                        *Por Cláudio Silva
Ouvi esta frase de um jovem depois da flaglorosa derrota da seleção nacional brasileira para o time da Alemanha. É claro que a expressão foi puro desabafo. Mas me impulsionou a refletir sobre o ocorrido, e situo três aspectos que ao meu ver precisam ser evidenciados:1.Os comentários na mídia; 2.A cultura do imediatismo;e 3.O papel do líder e das lideranças informais. São  três lições de uma derrota humilhante que nunca mais iremos esquecer.

Os comentários na mídia. Alguns parecem não ter compromisso com o que falam ou publicam. Ato contínuo ao final da partida, líamos e ouvíamos comentários em frontal contradição com o que as mesmas pessoas afirmavam antes. Me dei ao trabalho de pesquisar em alguns veículos conhecidos e fiquei surpreso, firmando ainda mais a minha convicção de que há muito comentário “rodando por aí” sobre os mais variados assuntos, feitos ao sabor do momento, e sem nenhum compromisso. Ou seja, “seguindo para onde o vento sopra”. Encontrei outros, sim, consistentes, que mantiveram uma linha de coerência antes e ao longo da copa. E de forma isenta de paixões, previam que selecionados que se prepararam melhor e que estão num momento mais promissor, poderiam sim sobrepujar o nosso.

Decorre daí, caro leitor, uma primeira e importante lição que podemos extrair dessa “tragédia”:  a importância do senso crítico diante dos meios de comunicação. Por mais famosa que a pessoa possa ser, isto não pode ser sinônimo de confiabilidade cega de nossa parte. Para aprender a pensar com a própria cabeça é preciso primeiro aprender a selecionar, e muito bem, as nossas fontes de informação, e analisá-las antes de firmar qualquer convicção. 
                                               
A cultura do imediatismo. Você mandaria demolir a sua casa hoje para erguer uma outra no lugar, por conta dos problemas que de vez em quando ela apresenta? Penso que a maioria de nós comuns mortais responderia que não. E se o fizesse, já pensou o quanto isto custaria? É claro que estaria desperdiçando esforço, tempo, trabalho e dinheiro investido, para recomeçar um outro empreendimento, que também no futuro vai apresentar com certeza necessidades de manutenção. O mais racional é fazer periodicamente uma boa avaliação e ir promovendo melhorias gradativas. Muitas pessoas que começaram com moradias bem modestas hoje se sentem morando bem confortavelmente. Pois é exatamente esse tipo de especulação e recomendações que povoam a mídia nesses momentos. Sob o pomposo nome de renovação, propõem demolir o que foi até aqui construído para começar tudo do zero. 

A cada copa perdida os mantras já são conhecidos:” é preciso acabar com a era Telê, Zagallo, Parreira, Dunga, Mano, agora Felipão, e amanhã será outro e outro”.  E são promovidos os massacres aos bodes espiatórios. Nos comentários pós derrota desses dias, têm aparecido também o lamento pela falta de nomes do time que disputou a Copa passada, e que poderiam ter dado uma maior experiência ao time atual. Em outras palavras, como diz o dito popular, foi jogada a água da bacia com a criança dentro. Boa parte dos jogadores de outros selecionados que brilharam nesta copa, e vários deles que estarão disputando a partida final, tem idades superiores à craques brasileiros respeitados em todo o planeta, e que não foram convocados por conta da idade. 

Esta cultura do imediatismo tem sido uma característica muito bem observada na vida pública do país, sempre às voltas com pretensos salvadores da pátria. Estes surgem a cada quatro anos e iludem a boa fé do povo com promessas renovadoras e soluções mágicas para resolver da noite para o dia complexos problemas do município, estado ou do próprio país. E literalmente jogam no lixo, por picuinhas políticas e outras intenções ainda menos nobres, projetos públicos sérios, anos de trabalho dedicado, talentos formados e o dinheiro do povo que foi investido, em nome de suas aventuras renovadoras. E o país vai assistindo ao longo da sua história a esses desvarios que se resumem a um passo para a frente e dois para trás. A seleção da Alemanha está jogando junta há seis anos e o trabalho de renovação do futebol alemão segue um planejamento estratégico de longo prazo que começou há doze anos após a vitória do Brasil na final da Copa de 2002. Ou seja, nada de imediatismo.  

O governo brasileiro não conseguiu dar conta em sete anos do plano de estruturação pactuado para o evento, e o técnico Luís Felipe Scolari começou a trabalhar com o selecionado nacional há dezoito meses. Um retrato da cultura do improviso e do imediatismo, que lamentavelmente contamina toda a sociedade. No dia a dia já nos acostumamos a ver nas academias de ginástica e escolas de idiomas, o desfile interminável de pessoas que começam e desistem depois de um breve tempo, porque ainda não atingiram aquele resultado que gostariam. Nosso futebol, nosso mundo político e empresarial, enfim a nossa sociedade precisa ser educada para a cultura do planejamento estratégico, cujos resultados são mais demorados, mas muito mais consistentes.  

O papel do líder e das lideranças informais. Na copa de 70, nos momentos difíceis, os jogadores mais jovens olhavam para os lados e viam nomes cuja experiência pesava, como Gerson, Tostão, Pelé e Rivelino. Em épocas mais recentes Júnior, Falcão, Zico, Roberto Carlos, Lúcio. Além do treinador e do capitão, nossos times fortes contavam também com lideranças informais fortes que se agigantavam e davam suporte  aos menos experientes nos momentos mais candentes. Conta a lenda que no selecionado de 70, em vários momentos os mais experientes dentro do campo subvertiam as próprias orientações do técnico em benefício de um melhor posicionamento na partida. No recente jogo contra a Alemanha o que se via eram os semblantes lívidos dos nossos literalmente “meninos” como Oscar e outros, simplesmente apavorados. Que olhavam para os lados e encontravam os companheiros ainda mais assustados,  e não figuras experientes e firmes que pudessem  lhes dar  sustentação. E o pior, olhavam para o seu técnico e o viam mudo, com o semblante apalermado, que até em determinado momento se sentou, numa clara demonstração de derrota. 

Gosto de assistir aos jogos olímpicos e ver os técnicos dos grandes atletas acompanhando-os com gritos de incentivo do começo ao fim, para que não baixem a guarda em nenhum momento. Embora sendo um admirador do Felipão pelo seu espírito de liderança e valores humanos e profissionais, alí ele falhou e sucumbiu com a equipe. Aparentemente pode ter havido também a falta de definição de  ações para situações inusitadas, como foi o caso do “apagão” do time. Um plano B para momentos de sinal vermelho. O livro “A  Arte da Guerra” de Sun Tzu ensina que é preciso estar preparado, e definir previamente  estratégias para  circunstâncias imprevistas. Prática que hoje é  observada no mundo empresarial. Nas organizações modernas é ressaltado o papel essencial do “coach”, aquele líder que pela sua força moral,  carisma, preparo e talento conduz a equipe ao alcance das metas, valendo-se de metodologias,técnicas e ferramentas de gestão. Mas também nenhuma organização ou equipe de trabalho pode deixar de lado o papel essencial das lideranças informais.  Exercido por aqueles companheiros de trabalho que mesmo sem cargos e títulos especiais são fundamentais para o equilíbrio do grupo, principalmente em situações de crises e dificuldades. Porque são pessoas que conseguem “incendiar” os companheiros principalmente os mais fracos e inexperientes, conseguindo com que o grupo se mantenha firme e coeso rumo aos objetivos. Observe-se que o capitão da Argentina é o Messi, mas a liderança informal exercida por um Mascherano e um Zabaleta, dentre outros, é digno de nota. 

Qual seria em nossa avaliação a recomendação mais coerente para o momento do nosso selecionado? O que um manual de administração observa quanto aos princípios do planejamento:  uma reavaliação do projeto básico e o estabelecimento das correções identificadas, dentro do plano em curso. E um replanejamento. Medidas que aperfeiçoam e fortalecem o projeto como um todo. Mas, infelizmente, já surgem na mídia notícias de que poderá haver a escolha de um outro técnico cujo nome tenha aceitação popular. É a tendência recorrente de se substituir a racionalidade pelo “ibope”. O que pode continuar dando guarida às raposas que se locupletam do lucrativo negócio chamado futebol. Ou seja, sempre o velho populismo tão nefasto à vida nacional. E a história tende a se repetir.

E quanto a essas histórias de ir embora do Brasil, ficar deprimido, tentar suicídio, agredir pessoas, queimar ônibus, ora façam-me o favor! A boa filosofia sempre alertou sobre a importância da busca de ideais elevados. “Porque onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração”( Mt 6,21). Quando o sentido da vida e a própria felicidade passam a depender de coisas, pessoas e resultados de futebol, passou da hora de parar urgente e rever muita coisa. Porque a vida segue.  
Pense nisso!

(Se achou esta crônica interessante, poste o seu comentário abaixo. Sua referência é importante para nós.)
*Cláudio Silva é mestre em Educação, ex- Secretário de Educação de Apucarana-PR e ex- presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME/PR. Diretor da Escola Nossa Senhora da Alegria                                                                                                    (mais textos do professor poderão ser acessados no site Prof. Cláudio Silva Educacional)
Ficha Técnica:Estrutura: Jornalista Cláudia Alenkire Gonçalves da Silva – MTE 000 9817 /PR Revisão:  Psicóloga Mestranda Cláudia Yaísa Gonçalves da Silva.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
·         GOLEMAN, Daniel, et al. Os Novos Líderes: a inteligência emocional nas organizações. Lisboa: Gradiva, 2002
·         OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Planejamento estratégico: conceitos, metodologia e prática. 17º. Ed. – São Paulo: Atlas, 2002

·         SUN TZU, século VI a. C. A Arte da Guerra. Rio de Janeiro: Record, 2001

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